quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Mitando


Para falar sobre o início da história da filosofia, a sua origem, devemos falar sobre os Mitos (Não, não é sobre o “mito” Chuck Norris que vamos falar, muito menos sobre P.J., a tentativa triste de imitar a magnifica história de Harry Potter). Mais precisamente, iremos falar um pouco a relação filosofia e mito na Grécia.

Uma das primeiras formas de compreender o mundo, o pensamento mítico, é uma tentativa de dar sentido, de conhecer, entender, de chegar a uma verdade, isso através de uma crença. Uma narrativa em busca da compreensão, de sanar os medos que aflige todos nós humanos mortais. A palavra “Mito” tem sua origem Grega, mythos (relato, fábula, conto, ...)[1].  Para que o mito tenha crédito, e seja visto como uma verdade plausível para a explicação do cosmo, dependerá muito de quem o fala, de quem narra. Imaginemos que eu diga a vocês que a terra é uma colônia de humanos em uma espécie de fazenda de formigas, e que estamos aos cuidados de uma espécie de ser em sua fase de existência infantil. Bom, talvez não convença muito, mas, se fosse um ancião, um velhinho com aquele aspecto de sabedoria, talvez iria ter mais credibilidade. O que tento mostra é que não havia um método racional, algo que poderia ser acessado por todos através da razão, ou você acreditava e agora viveria mais tranquilo com a natureza, longe da insegurança e do medo, já que você tinha uma explicação para o universo e tudo mais (42), ou não acreditava. Simples assim.  Mas, e a Filosofia com isso?


A Filosofia surge dessa mesma necessidade, de explicar o mundo, mas ela o faz de forma diferente, ela tenta explicar de forma racional o mundo, de forma lógica, usando apenas a razão, sem intervenção de seres divinos ou cósmicos. É uma saída da doxa (palavra grega que significa “crença”, “opinião comum”...) para uma episteme (outra palavra grega, que significa algo como “ciência”, “saber verdadeiro”, ou, nas palavras de uma certa moça, “inteligência pura!”), a filosofia é a saída da caverna para a luz (Ver - Alegoria da Caverna, Platão), ou, como Parmênides coloca, é sair da “da via da opinião” e ir para o “caminho da verdade”.


Mas, esse surgimento da filosofia no ocidente (sim, no ocidente, pois eu sou da galerinha que não acredita que a filosofia teve um local especifico/único para seu surgimento... [para futuras postagens]) não foi de repente, como um big bang, pois parece que ao contar isso para os alunos, eles acabam por achar que tudo foi como em um passe de magia negra, e o que de fato é um pouco mais complexo, onde, então, houve foi várias situações que contribuíram para o “surgimento”, eu, para esse caso da passagem do mito para a filosofia, destaco a interação entre os povos daquela região (mas, recomendo, que você pesquise mais um pouco sobre o Milagre Grego.), onde a interação grega com outros povos, contribui para que alguns fossem em busca de outras verdades, já que as anteriores pareciam não ser mais tão satisfatórias e acalentadoras.  Imagine que você é um ser apaixonado e o outros ser, motivo de tal paixão, informa que na sexta passada estava doente em casa. Ok? Certo. Você acredita loucamente nessa pessoa, é uma verdade indiscutível, todavia, chega aos seus ouvidos que na sexta, sua paixão na verdade estava em um Reggae. E então? Fica no mundo da doxa ou corre para busca da episteme. Com certeza, grande parte iria tentar ir atrás da versão mais concreta da história. A filosofia também surge assim, dessa curiosidade para descobrir a verdade, mesmo que as vezes não possamos suportar tal verdade (Chora, míZera!* ).


É melhor viver filosofando do que iludido nessa mízera!


Bom, deixo alguns devaneios para vocês e dois fragmentos interessantes (ah, e depois posto algumas questões com comentários) -  


I. Vivemos ainda acreditando em muitos “mitos”? Será que ainda nos prendemos em algumas ideias apenas pelo medo da verdade? Existe verdades absolutas?


II. As redes sociais estão cheias de doxas e será que compartilhamos muitas delas sem ter nenhum tipo de olha crítico (filosófico)?


III.

A tendência comum nos dias atuais de interpretar a palavra "mito" como significando "inverdade" é quase com certeza um sintoma da incredibilidade e conseqüente ineficácia de nossos próprios ensinamentos míticos ultrapassados, tanto os do Velho quanto do Novo Testamento: a Queda de Adão e Eva, os Mandamentos, as Chamas do Inferno, o Segundo Advento do Salvador etc., e não apenas desses Testamentos religiosos arcaicos, mas também dos vários, mais modernos, e seculares "utopiatos" (vamos chamá-los assim) que estão sendo oferecidos para substituí-los.

Mitos vivos não são idéias equivocadas e não nascem em livros. Não devem ser julgados como verdadeiros ou falsos, mas como eficazes ou ineficazes, salutares ou patogênicos.

Assemelham-se mais a enzimas, produtos do corpo no qual agem, ou de grupos sociais homogêneos, caso em que são produtos do corpo social.

Não são inventados, surgem, e são reconhecidos por videntes e poetas para serem em seguida cultivados e usados como catalisadores de bem-estar espiritual (i.e., psicológico). E, por último, não sobreviverá a mitologia velha e tardia, nem a inventada ou falsa, e tampouco os sacerdotes e sociólogos que tomam o lugar do poeta-vidente — o que, contudo, é o que todos nós somos em nossos sonhos, embora, quando acordamos, possamos falar apenas em prosa.

"Da mesma forma que aqueles que não conhecem o lugar", lemos no Chandogya Upanishad, "podem passar e repassar sobre o tesouro oculto de ouro sem descobri-lo, assim todas as criaturas andam, dia após dia, neste mundo incondicionado de ser-consciência-beatitude sem descobri-lo, porque desviadas por falsos pensamentos." Extraido do livro “O VOO DO PÁSSARO SELVAGEM - ENSAIO SOBRE A UNIVERSALIDADE DOS MITOS”, de Joseph Campbell, Ed Rosa dos Tempos, 1997.



IV.

“Um conhecido homem de ciência (segundo as más línguas, Bertrand Russel) deu uma vez uma conferência sobre astronomia. Descreveu como a Terra orbita em volta do Sol e como o Sol, por sua vez, orbita em redor do centro de um vasto conjunto de Estrêlas que constitui a nossa galáxia (1). No fim da conferência, uma velhinha, no fundo da sala, levantou-se e disse: "O que o senhor nos disse é um disparate. O mundo não passa de um prato achatado equilibrado nas costas de uma tartaruga gigante." O cientista sorriu com ar superior e retorquiu com outra pergunta: "E onde se apóia a tartaruga?" A velhinha então exclamou: "Você é um jovem muito inteligente, mas são tudo tartarugas por aí abaixo!"

A maior parte das pessoas acharia bastante ridícula a imagem do Universo como uma torre infinita de tartarugas. Mas o que nos leva a concluir que sabemos mais? Que sabemos ao certo sobre o Universo e como atingimos esse conhecimento? De onde veio e para onde vai? Teve um princípio e, nesse caso, que aconteceu antes dele? Qual é a natureza do tempo? Acabará alguma vez?” (Stephen W. Hawking in Uma Breve História do Tempo)


[1] Wiktionary contributors, "mythos," Wiktionary, The Free Dictionary, https://en.wiktionary.org/w/index.php?title=mythos&oldid=34173148 (accessed September 5, 2015).
*mísera 


Até logo, mortais.

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